Toda vez que eu escuto a pergunta "o que você quer fazer da vida?", embora eu saiba que ela normalmente se refere à escolha profissional, eu me pergunto o que ela quer dizer. Uma vida inteira é bastante tempo. Será que não é suficiente você saber o que faz sentido para você no presente e, no máximo, num futuro próximo? Afinal, como garantir que uma escolha que você faz agora faça sentido para uma versão sua que você ainda nem conhece?
Coincidentemente, no dia em que escrevi esse texto, uma amiga me disse: "É normal que, nos seus primeiros empregos, você ainda não tenha clareza do que você quer. Ao longo do tempo, acumulamos certezas." E pensei: mesmo assim, essas certezas são cobradas dos jovens. Isso faz com que alguns de nós tentem transmitir ou até mesmo construir essas certezas. Mas certezas sem repertório são castelos de areia. E, no fundo, sabemos disso. Daí surge a insegurança.
Vestibulandos não são ensinados a se perguntarem por que querem fazer faculdade.
Atualmente, as possibilidades do que "se fazer na vida" são muitas. Algumas que ainda não conhecemos. Outras que podemos criar. Mas isso demanda repertório e, em vez de sermos ensinados a aumentá-lo, através de experiências e de conhecimento, somos ensinados a decidir, de uma vez só e com obrigação de "acertar", por exemplo, nossas escolhas profissionais. Sem sequer nos questionarmos o significado de cada escolha.
E para quê? Apenas para dar uma — falsa — sensação de segurança a nós mesmos ou às pessoas ao nosso redor. A impressão que tenho é de que, embora esse "fulano se encontrou" dê alívio, pode facilmente se tornar um "fulano conseguiu se encaixar num modelo de felicidade ou de sucesso e, aparentemente, acabou com todas as suas incertezas." Aparentemente.
Quanto mais velha eu fico, menos entendo porque cobram certezas de jovens. Como se, ao escolhermos um determinado caminho, estivéssemos presas a ele para sempre — como se você não pudesse mudar de carreira ou fosse obrigada a exercer apenas uma profissão. É claro que mudanças se tornam mais complexas à medida que adquirimos mais responsabilidades, mas elas não precisam ser repentinas nem definitivas. Logo, não são impossíveis.
Você não precisa "se encontrar." Você já é.
Infelizmente, somos ensinados a associar segurança à controle e à previsibilidade. Não importa que, na verdade, tenhamos poucas garantias — se é que temos alguma. Mesmo assim, tentamos. Contudo, a única maneira de manter uma situação sob controle é fechando-se para o desconhecido e para o novo. Não totalmente, é claro. Como escreveu Edgar Morin, todo sistema totalmente fechado acaba colapsando em si mesmo; por isso, precisa de uma abertura por onde possa fluir conteúdo do exterior para o interior e vice-versa. Mas a gente tenta controlar essa fluidez — o que vai diretamente de encontro à natureza dela.
Por isso, não acredito mais que a gente "se encontre", como se nossa essência fosse um tesouro escondido em algum lugar. Acredito que a gente se construa, a partir das nossas experiências. Você não precisa saber qual será seu futuro para começar a construí-lo. Você pode fazê-lo aproveitando ao máximo as oportunidades que você tem no presente.
No fim das contas, você já sabe "o que quer fazer da vida."
Você pode encontrar a segurança da qual precisa em si mesma. É uma segurança que, talvez, leve tempo para ser construída; mas é verdadeira. Isso porque decidir seu futuro não é nada mais do que direcionar seu presente. Pergunte-se: quais são as suas prioridades? Quais são as oportunidades disponíveis agora? Quais são as suas necessidades? O que você deseja ou não deseja para a sua vida?
O autoconhecimento não impede que a gente, de vez em quando, se sinta atropelada, coagida ou sequestrada pelo mundo. Mas constrói a certeza de que, mesmo que a gente se perca, sempre encontraremos o caminho de volta para nós mesmas. Isso porque passar por experiências que não tem nada a ver conosco apenas para chegarmos a essa conclusão não é errar; é aumentar o repertório.
Afinal, talvez você nunca descubra "o que quer fazer da vida." Talvez você só viva. O resto das nossas vidas, no fim das contas, não é nada mais do que uma sucessão de presentes.
Originalmente publicado no Lua Post. Se quiser ler mais artigos como esse, só dar uma passadinha em theluapost.com.